Mulheres grávidas

Saúde reprodutiva e doenças reumatológicas

Introdução

O manejo de problemas de saúde reprodutiva em pacientes com doenças reumáticas e musculoesqueléticas (DRM) difere daquele em pessoas saudáveis.

A gravidez em mulheres com DRM pode levar a resultados adversos maternos ou fetais

Como o risco de complicações na gravidez depende do diagnóstico, atividade e danos da doença, medicamentos e presença de anticorpos anti-Ro/SSA, anti-La/SSB e antifosfolípides (aPL). A avaliação pré-gravidez é fundamental para informar o manejo da gravidez, terapia e resultados.

A capacidade de engravidar pode ser uma preocupação independente para alguns pacientes, portanto, minimizar o risco de insuficiência gonadal é importante.

É difícil evitar o uso de medicamentos durante a gravidez em pacientes com DRM.

Nem todos os medicamentos são seguros para uso pré-concepcional por homens e mulheres ou durante a gravidez e lactação, mas a doença inflamatória sistêmica descontrolada está associada a resultados ruins da gravidez.

Em muitos casos, a segurança da medicação é incerta porque a maioria dos dados são derivados de relatos de casos, pequenas séries e estudos observacionais. Dados diretos de ensaios controlados randomizados são escassos.

Em geral, o teste para anticorpos aPL deve ser realizado em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES) e em pacientes com história clínica ou exame físico sugestivo de sindrome antifosfolípide. A verificação desses anticorpos em outros pacientes com DRM com menor probabilidade de resultados positivos deve ser decidida em discussão médico-paciente.

Contracepção

A razão mais importante para a contracepção eficaz em mulheres com DRM é evitar riscos de gravidez não planejada, que incluem piora da atividade da doença que pode ameaçar a função ou a vida materno e fetal.

Em mulheres férteis com DRM que não têm LES nem aPL positivo, é recomendado fortemente o uso de contraceptivos eficazes (ou seja, contraceptivos hormonais ou DIU) em vez de opções menos eficazes ou sem contracepção.

Há uma ampla gama de métodos contraceptivos eficazes: métodos contendo estrogênio, que contêm estrogênio e progesterona, como contracepção oral combinada (COC), anel vaginal e adesivo transdérmico; compostos somente de progestágeno, como a pílula só de progestágeno (POP) ou o implante subdérmico; dispositivos intra-uterinos (DIU), que podem ser DIU de cobre (sem hormônios) ou DIU liberador de progestágeno. Quanto ao grau de eficácia, o DIU é considerado altamente eficaz, com uma taxa de falha de 1 ano (taxa de gravidez) inferior a 1%, enquanto COC ou POP são considerados eficazes com uso ideal e frequente (taxa de falha de 1 ano entre 5 e 8%).

Recomendado fortemente discutir o uso da contracepção de emergência com todos os pacientes, incluindo aqueles com LES ou aPL positivo, porque os riscos da contracepção de emergência são baixos em comparação com os da gravidez não planejada.

Em pacientes com LES com atividade da doença estável ou baixa que não são positivas para aPL, é recomendado fortemente o uso de contraceptivos eficazes (ou seja, contraceptivos hormonais ou DIU) em vez de opções menos eficazes ou sem contracepção.

Recomendado enfaticamente contraceptivos apenas de progestógeno ou DIU em vez de contraceptivos combinados de estrogênio-progestágeno em pacientes com LES com atividade moderada ou grave da doença, incluindo nefrite, porque contraceptivos contendo estrogênio não foram estudados em pacientes com LES com atividade moderada ou grave da doença.

Recomendado fortemente contra contraceptivos combinados de estrogênio-progestina em mulheres com aPL positivo porque o estrogênio aumenta o risco de tromboembolismo.

Como os DIUs são as opções contraceptivas mais eficazes, é recomendado fortemente o DIU (de cobre ou progestágeno) para mulheres com DRM que estejam recebendo terapia imunossupressora.

Mulheres com DRM que tomam micofenolato de mofetil/ácido micofenólico (MMF) usem um DIU sozinho ou 2 outros métodos de contracepção juntos, porque o MMF pode reduzir os níveis séricos de estrogênio e progesterona (reduzindo, por sua vez, a eficácia dos contraceptivos orais).

Injeções de acetato de medroxiprogesterona pode levar a uma redução discreta da densidade mineral óssea, cuidado com pacientes com risco de osteoporose.

Reprodução assistida

As técnicas incluem estimulação ovariana, que eleva os níveis de estrogênio, fertilização in vitro e transferência de embriões.

Candidatas a fertilização in vitro  mulheres com DRM não complicada que estejam recebendo medicamentos compatíveis com a gravidez, cuja doença esteja estável/quiescente.

Adiamento dos procedimentos de reprodução assistida em pacientes com qualquer DRM enquanto a doença estiver moderada ou gravemente ativa

Para o planejamento da gravidez, 6 meses de inatividade estável.

Recomendado contra um aumento empírico da dosagem de prednisona durante procedimentos de reprodução assistida em pacientes com LES.

Os pacientes que são positivos para aPL têm maior risco de trombose. A maioria dos relatos de pacientes aPL-positivos submetidos à fertilização in vitro descreve o uso de anticoagulação profilática empírica devido à preocupação com o aumento do risco de trombose potencialmente fatal devido aos níveis elevados de estrogênio durante a estimulação ovariana.

Em pacientes subférteis com DRM que desejam engravidar, têm doença estável/quiescente e têm aPL positivo assintomático, sindrome antiosfolípide obstétrica ou trombótica tratada, recomendado terapia de reprodução assistida com anticoagulação, conforme descrito abaixo:

  • Terapia de anticoagulação profiláticacom heparina de baixo peso molecular (HBPM) em pacientes aPL positivos assintomáticos durante o procedimento.
  • Terapia de anticoagulação profiláticacom HBPM em pacientes SAF obstétrica durante o procedimento.

A dosagem profilática de enoxaparina é geralmente de 40 mg por dia, iniciada no início da estimulação ovariana, suspensa 24 a 36 horas antes da coleta do oócito e retomada após a coleta

O tratamento geralmente é continuado até que os níveis de estrogênio retornem a níveis quase fisiológicos, se não ocorrer gravidez.

A aspirina não é comumente usada antes da coleta de oócitos

  • Os pacientes que recebem terapia anticoagulante regular com antagonistas da vitamina K para SAF trombótica devem fazer a transição para HBPM em dose terapêutica (geralmente enoxaparina 1 mg/kg por via subcutânea a cada 12 horas).

LES ativo, hipertensão arterial mal controlada, doença renal avançada e eventos trombóticos importantes prévios são situações em que as técnicas de reprodução assistida não devem ser realizadas, devido não só aos riscos ligados à elas como também à gravidez subsequente.

Sexualidade

A saúde sexual é definida pela OMS como um estado de bem-estar físico, emocional, mental e social em relação à sexualidade. A vida sexual dos pacientes representa uma esfera importante e contribui para a qualidade de vida. Portanto, deve fazer parte da avaliação também em pacientes com doenças reumáticas, porém é comum ser ignorada pelos profissionais de saúde.

Dor, fadiga e diminuição da mobilidade articular causada por doenças reumáticas geralmente diminuem a saúde sexual desses pacientes. Ausência de desejo, secura vaginal, disfunção erétil relacionada a alterações vasculopáticas e fibróticas, dispareunia e padrão de distribuição da psoríase podem ser barreiras adicionais para relacionamentos íntimos.

Esses sintomas podem resultar em sentimentos de culpa, tensões no relacionamento com o parceiro e frustração, que por sua vez pioram ainda mais a saúde sexual em pacientes reumáticos. Portanto, é importante dar suporte aos pacientes e sugerir formas de superar as dificuldades mais comuns.

Preservação fertilidade em mulheres

Para prevenir a indução de insuficiência ovariana primária em mulheres na pré-menopausa com DRM recebendo mensalmente ciclofosfamida intravenoso, pode-se considerar a co-terapia mensal com agonistas do hormônio liberador de gonadotropina.

Preservação da fertilidade em homens com DRM tratados com ciclofosfamida

O medicamento pode causar infertilidade e dano gonadal de longo prazo em homens tratados. Opções para preservação da fertilidade devem ser apresentadas a pacientes do sexo masculino nos quais a terapia com a ciclofosfamida (CYC) é necessária.

Como a criopreservação de esperma antes do tratamento preserva a capacidade do homem de conceber uma criança saudável, sendo sugerido esta como uma boa prática para homens tratados com CYC que a desejem.

Não é indicado terapia com reposição de testosterona.

Menopausa e terapia de reposição hormonal (TRH)

Sugerido fortemente como boa prática o uso de TRH em mulheres na pós-menopausa com DRMs sem LES ou aPL positivo que apresentam sintomas vasomotores graves, não têm contraindicações e desejam tratamento com TRH.

Em pacientes com LES sem aPL positivo que desejam TRH devido a sintomas vasomotores graves e não têm contraindicações, recomendado condicionalmente o tratamento com TRH.

Pacientes com aPL positivos contrainidicado TRH.

Gravidez

Idealmente os reumatologistas avaliarão a atividade da doença e modificarão o tratamento, se necessário, para alcançar uma remissão estável da doença antes da concepção (idealmente 6-12 meses), usando medicamentos compatíveis com a gravidez.

Alterações na gravidez podem afetar as manifestações de DRM. O aumento do volume intravascular relacionado à gravidez pode piorar a função cardíaca ou renal já anormal. O aumento esperado de 50% na taxa de filtração glomerular durante a gravidez pode piorar a proteinúria estável preexistente. A hipercoagulabilidade induzida pela gravidez aumenta o risco de trombose associada a DRMs. A demanda de cálcio do desenvolvimento ósseo fetal e a amamentação podem piorar a osteoporose materna. Além disso, os sintomas normais da gravidez, como eritema malar, cloasma gravídico, anemia, sedimentação eritrocitária elevada e artralgias difusas, podem imitar falsamente os sintomas de DRMs ativa.

As síndromes de hipertensão induzida pela gravidez (pré-eclâmpsia) podem ser confundidas com nefrite lúpica, crise renal esclerodérmica ou crise de vasculite. Síndrome HELLP (hemólise, elevação das enzimas hepáticas, e plaquetas baixas) ou eclâmpsia podem assemelhar-se a exacerbação grave da doença.

Mulheres que estão considerando a gravidez devem faze-lá com doença em baixa atividade ou remissão.

Em mulheres com DRMs planejando uma gravidez que estão recebendo medicamentos incompatíveis com a gravidez, recomendado fortemente a mudança para um medicamento compatível com a gravidez e observação por tempo suficiente para avaliar a eficácia e a tolerabilidade do novo medicamento.

Em mulheres com DRMs que estão atualmente grávidas e têm doença ativa que requer terapia médica, recomendado fortemente iniciar ou continuar uma medicação poupadora de esteroides compatível com a gravidez.

Recomendado fortemente o teste de anti-Ro/SSA e anti-La/SSB uma vez antes ou no início da gravidez em mulheres com LES, síndrome de Sjögren, esclerose sistêmica e artrite reumatóide. Sem necessidade de titular durante a gestação.

Recomendado fortemente o uso de inibidor da enzima conversora de angiotensina (IECA) ou terapia de bloqueio do receptor de angiotensina (BRA) para tratar a crise renal esclerodérmica ativa na gravidez, porque o risco de morte materna ou fetal com doença não tratada é maior do que o risco associado ao uso desses medicamentos durante a gravidez.

Em mulheres com LES que estão pensando em engravidar ou estão grávidas, recomendado fortemente o teste de anticorpos anticoagulante lúpico, anticardiolipina IgG e IgM e anti-β 2 glicoproteina IgG e IgM uma vez antes ou no início da gravidez e contra a repetição desses testes durante a gravidez.

Recomendado que todas as mulheres com LES tomem hidroxicloroquina (HCQ) durante a gravidez, se possível.

Recomendado condicionalmente o tratamento de pacientes com LES com aspirina em baixa dose (81 ou 100 mg por dia), começando no primeiro trimestre.

Como a doença ativa afeta o resultado materno e da gravidez, sugerido fortemente, como boa prática, monitorar a atividade da doença do LES com história clínica e exames laboratoriais pelo menos uma vez por trimestre.

Anormalidades na contagem completa de células sanguíneas, resultados de urinálise e relação proteína/creatinina urinária, níveis de anti-DNA, C3 ou C4 podem indicar possível surto de LES e/ou pré-eclâmpsia, apesar da ausência de sintomas clínicos.

As modificações imunológicas que ocorrem durante a gravidez são capazes de provocar uma melhora natural da artrite reumatoide. Após o parto, os efeitos imunomoduladores mediados por antígenos fetais e hormônios da gravidez desaparecem, dando origem à atividade dos linfócitos juntamente com a atividade persistente do gene dos monócitos, que pode desencadear um agravamento da doença.

A artrite idiopática juvenil (AIJ) oferece um cenário único, pois as mulheres geralmente iniciam a gravidez com doença de longa duração, exposição prolongada a csDMARDs e bDMARDs e danos articulares irreversíveis. Investigações mais recentes relataram uma alta taxa de exacerbações durante a gestação. Em particular, os últimos mostraram que a atividade da doença permanece substancialmente estável no primeiro trimestre para aumentar significativamente no segundo trimestre.

Espondiloartrite é um grupo grande e heterogêneo de doenças, que inclui Espondilite anquilosante (axSpA) e Artrite Psoriásica(APs). Em relação à atividade da doença durante a gravidez, a axSpA tende a permanecer inalterada ou piorar, enquanto a APs pode permanecer estável ou melhorar. Ambas as doenças apresentam alta frequência de surtos no período pós-parto.

A gravidez em mulheres com esclerose sistêmica (ES) é um desafio. Estudos sobre gestações com ES mostraram um risco ligeiramente aumentado de abortos, uma maior prevalência de hipertensão gestacional,  parto prematuro e alto risco de pré-eclampsia. Existem poucos dados de estudos não controlados sobre o impacto da gravidez na evolução da ES materna. A maioria das mães com ES relata estabilidade na maioria dos domínios da doença. A gravidez deve ser planejada evitando situações de alto risco, que incluem: medicações potencialmente teratogênicas como bosentana, agentes imunossupressores como metotrexato ou micofenolato de mofetil e terapia antifibrótica com nintedanibe; doença cutânea difusa precoce ou doença rapidamente progressiva – devido ao risco de envolvimento cardíaco ou pulmonar grave e crise renal esclerodérmica; hipertensão arterial pulmonar; insuficiência cardíaca (classe III-IV da NYHA ou fração de ejeção do ventrículo esquerdo abaixo de 40%); doença pulmonar intersticial grave.

O principal risco de gravidez na Arterite de Takayasu (TAK) estabelecida é o comprometimento da função aórtica. Devido à fibrose da parede do vaso, a complacência, ou seja, a capacidade da aorta se distender e aumentar o volume com o aumento da pressão transmural, diminui. Uma medida simples para estimar a complacência é a pressão de pulso (diferença entre a pressão arterial sistólica e diastólica, medida em milímetros de mercúrio). Em mulheres jovens, a pressão de pulso deve ficar abaixo de 50 mmHg. A hipertensão arterial é a complicação mais importante e frequente da TAK. Consequentemente, um aumento da frequência cardíaca, do volume sistólico e do débito cardíaco no final da gravidez acarreta o risco de ruptura aórtica e de insuficiência cardíaca.

Pacientes positivos para anticorpos antifosfolípides

As gestações em pacientes com aPL positivos ou sindrome antifosfolípide (SAF) apresentam desafios específicos e podem exigir monitoramento e terapia adicionais.

A presença de aPL tem sido consistentemente associada a resultados adversos da gravidez, incluindo aborto precoce recorrente, morte fetal, baixo peso, prematuridade, pré-eclampsia e trombose materna.

A perda gestacional pode ocorrer em qualquer fase da gestação, principalmente durante o segundo e terceiro trimestres (cerca de 50% dos casos).

Pacientes aPL-positivos assintomáticos (aqueles sem complicações na gravidez ou história de trombose) geralmente não são tratados com terapia profilática para prevenir a perda da gravidez. No entanto, a presença de aPL independentemente da história clínica é considerada um fator de risco para o desenvolvimento de pré-eclâmpsia.

É consenso que um perfil de aPL de “alto risco” (risco de trombose e morbidade na gravidez) é identificado como a presença de: 1) anticoagulante lúpico positivo; 2) positividade tripla de aPL (todos os 3 testes positivos); 3) a presença de títulos médio-altos de IgG anticardiolipina e anti-ß2glicoproteína I; 4) persistência de aPL positivo ao longo do tempo (aPL transitório tem maior probabilidade de ser aPL não autoimune e não patogênico).

Em mulheres grávidas com aPL positivo que não atendem aos critérios para SAF obstétrica ou trombótica, recomendado condicionalmente o tratamento com aspirina profilática, 81 ou 100 mg por dia, durante a gravidez como profilaxia da pré-eclâmpsia.

O tratamento deve começar no início da gravidez (antes de 16 semanas) e continuar até o parto.

Recomendado a combinação de aspirina em baixa dose e heparina em dose profilática (até 6 a 12 semanas após o parto) para pacientes que atendem aos critérios para SAF obstétrica.

Em mulheres grávidas com SAF trombótica, recomendado fortemente o tratamento com aspirina em baixa dose e heparina em dose terapêutica (geralmente HBPM) durante a gravidez e pós-parto.

Imunoglobulina intravenosa, prednisona em baixa dose ou aumento da dose de heparina/HBPM não são recomendadas nos casos de SAF obstétrica recorrente. A hidroxicloroquina pode ser considerarada nesses casos.

Com manejo adequado, mais de 70% das mulheres grávidas com SAF dão à luz um bebê saudável e viável.

Anticorpos anti-Ro/SSA e/ou anti-La/SSB na gravidez

O lúpus eritematoso neonatal (LEN) descreve várias manifestações fetais e infantis causadas ou associadas a autoanticorpos maternos anti-Ro/SSA (comumente) e anti-La/SSB.

Enquanto o anti-La/SSB isolado raramente impõe risco, quando combinado com anti-Ro/SSA, os anticorpos La/SSB podem aumentar o risco fetal.

Estudos prospectivos de bebês nascidos de mulheres com anticorpos anti-Ro/SSA e/ou anti-La/SSB mostram que aproximadamente 10% desenvolvem uma erupção cutânea de LEN, 20% citopenias transitórias e 30% transaminite transitória leve (as estimativas variam amplamente entre os relatórios). Essas complicações são de curta duração e se resolvem espontaneamente com o desaparecimento dos anticorpos maternos da criança.

Bloqueio cardíaco (CHB) completo (de terceiro grau) ocorre em aproximadamente 2% das gestações (13 a 18 % de gestações de mulheres com um filho anterior que teve lupus neonatal cutâneo ou cardíaco). É irreversível e o tratamento deve ser encaminhado a cardiologistas pediátricos. Aproximadamente 20% das crianças com CHB morrem no útero ou no primeiro ano de vida, mais da metade precisará de marcapasso.

Em mulheres grávidas com anticorpos anti-Ro/SSA e/ou anti-La/SSB, mas sem história de lactente com CHB ou LEN, recomenda-se ecocardiografia fetal serial (menos frequente que semanal; intervalo não determinado) começando entre 16 e 18 semanas e continuando até a semana 26. Para mulheres com um bebê anterior com CHB ou outro LEN, recomenda-se ecocardiografia fetal semanalmente , começando na semana 16–18 e continuando até a semana 26.

Recomendação condicional o tratamento de todas as mulheres positivas para anticorpos anti-Ro/SSA e/ou anti-La/SSB com hidroxicloroquina durante a gravidez.

Para mulheres grávidas com anticorpos anti-Ro/SSA e/ou anti-La/SSB e bloqueio cardíaco fetal de primeiro ou segundo grau mostrado na ecocardiografia, recomenda-se condicionalmente o tratamento com dexametasona oral 4 mg ao dia. Para bloqueio cardiaco completo não tem benefício.

Uso de medicamentos

Mulheres

Sempre discutir sobre os medicamentos e os efeitos teratogênicos com as pacientes em idade fértil. Quando for suspender medicamentos teratogênicos para tentativa da gestação deve-se observar observar a paciente por um perído para ver se não irá ocorre flare da doença antes da gravidez. Idealmente paciente 6 meses sem atividade de doença.

Quando nenhum medicamento compatível com a gravidez é adequado, o controle da doença materna grave/com risco de vida deve ter prioridade sobre as preocupações com possíveis resultados fetais.

Metotrexato, ciclofosfamida, talidomida devem ser interrompidos 3 meses antes da concepção, micofenolato 6 semanas antes.

Deve-se manter acido folico 5mg/dia se engravidar com menos de 1 mês de suspensão do metotrexato, até pelo menos 12 semanas de gestação.

Para as tratadas com leflunomida e ainda com metabólitos ativos séricos recomendado eliminação com colestiramina. Idealmente suspender o medicamento 2 anos da gestação.

Hidroxicloroquina, azatioprina, colchicina, sulfassalazina, tacrolimus/ciclosporina (monitoramento da pressão arterial materna, função renal, glicemia), AINEs não seletivos (não usar no terceiro trimestre) são compatíves para uso na gestação.

Imunoglobulina intravenosa é compatível com a gestação.

Recomendado condicionalmente a continuação do tratamento com glicocorticóides em baixas doses (≤10 mg diários de prednisona ou equivalente não fluorado) durante a gravidez, se clinicamente indicado. Recomendado enfaticamente reduzir doses mais altas de glicocorticóides não fluorados para <20 mg diários de prednisona, adicionando um agente poupador de glicocorticóides compatível com a gravidez, se necessário.

Recomendado condicionalmente a continuação da terapia com inibidores do fator de necrose tumoral com infliximabe, etanercepte, adalimumabe ou golimumabe antes e durante a gravidez.

O inibidor do fator de necrose tumoral certolizumab não contém uma cadeia Fc e, portanto, tem transferência placentária mínima. Recomendamos vivamente a continuação da terapêutica com certolizumab antes e durante a gravidez (podendo ser usado durante toda gestação).

O uso de inibidores do fator de necrose tumoral (TNF) que incluem uma construção IgG1-Fc durante o terceiro trimestre (infliximabe, etanercepte, adalimumabe e golimumabe) resulta em altos níveis de transferência placentária e níveis significativos de drogas no recém-nascido. Uma quantidade modesta de evidências sugere que esses inibidores de TNF não causam efeitos adversos, especialmente no primeiro trimestre. Se a doença da paciente estiver sob bom controle, esses medicamentos podem ser descontinuados no terceiro trimestre. Embora haja escassez de dados de segurança, pode-se considerar a continuação dos inibidores de TNF até o parto se a doença do paciente estiver ativa.

As mulheres consideradas de baixo risco de exacerbação da doença com a retirada do TNFi na gravidez podem interromper o INF às 20 semanas, ADA e GOL às 28 semanas e ETA às 32 semanas, para que um bebê nascido a termo possa ter um calendário normal de vacinação.

INF, ADA, ETA ou GOL se continuados durante a gravidez toda para manter o controle da doença materna, nessas circunstâncias, as vacinas vivas devem ser evitadas em lactentes até os 6 meses de idade.

Se um TNFi for interrompido durante a gravidez, ele pode ser reiniciado assim que possível após o parto, na ausência de infecções ou complicações cirúrgicas, independentemente do status da amamentação, para garantir o controle da doença materna.

Evidências limitadas não demonstraram que o rituximabe, abatacept, inibidor IL6, IL-1, IL-17, IL 12/23,belimumabe, seja teratogênico; no entanto, ainda há evidências insuficientes para ter certeza de que é compatível com a gravidez. Considere parar o medicamento na concepção. São compatíveis no período periconcepcional. Eles podem ser considerados para controlar a doença materna grave na gravidez se nenhum outro medicamento compatível com a gravidez for adequado.

Se forem usados para tratar doenças maternas graves no terceiro trimestre, atualmente é recomendado evitar todas as vacinas vivas no esquema de vacinação infantil até os 6 meses de idade .

Não há dados suficientes para fazer uma recomendação sobre o uso de JAKi durante a gravidez e eles devem ser interrompidos pelo menos duas semanas antes da concepção planejada.

Amamentação

Sugerido como boa prática que as mulheres com DRM sejam encorajadas a amamentar se assim o desejarem e puderem fazê-lo.

Além disso, sugerimos que o controle da doença seja mantido com medicamentos compatíveis com a lactação e que riscos e benefícios individualizados sejam revistos com cada paciente.

Hidroxicloroquina, colchicina, sulfassalazina, rituximabe, anti-TNF, prednisona < 20mg (doses maiores atrasar a amamentação por 4 horas após tomada do medicamento), azatioprina e biológicos não TNF são compatíveis com a amamentação.

Imunoglobulina intravenosa é compatível com a amamentação.

Não recomendado o uso de ciclofosfamida, leflunomida, micofenolato, talidomida e metotrexato.

Não há dados suficientes para recomendar o JAKi na amamentação e, como é provável que passem para o leite materno, devem ser evitados.

Reprodução Masculina

A reprodução masculina requer o funcionamento adequado das diferentes etapas que levam a uma fertilização bem-sucedida. Isso implica um processo adequado de espermatogênese e uma regulação endócrina equilibrada das células somáticas testiculares e das células germinativas.

O efeito direto das doenças autoimunes no testículo é explicado pela desregulação entre o sistema regulador e as citocinas pró-inflamatórias. De fato, a infiltração do interstício testicular por células imunes induz a produção de citocinas pró-inflamatórias, como a proteína quimioatraente de monócitos-1 (MCP1), TNFα, interleucina 1, interleucina 6 e óxido nítrico sintase (NOs), levando a danos peroxidativos tanto nas células epididimárias quanto nos espermatozóides.

Outros mecanismos incriminados são a desregulação da esteroidogênese pelos níveis reduzidos de testosterona e a orquite autoimune pela formação de autoanticorpos contra antígenos testiculares. A varicocele também está envolvida em algumas DRMs (espondiloartrite e Behçet).

Cerca de 36-70% dos homens que vivem com artrite inflamatória têm saúde reprodutiva prejudicada atribuída à sua doença.

Em pacientes com LES, além da ciclofosfamida, a própria doença leva a anormalidade espermática, alteração de motilidade e na espormatogênese.

Em pacientes com Artrite Reumatoide foi evidenciado hipogonadismo com baixos níveis de testosterona.

Os dados sobre fertilidade em pacientes com espondiloartrite são discordantes. A função gonadal normal é relatada na maioria dos estudos. De fato, não há diferenças na qualidade do sêmen entre pacientes e controles saudáveis. No entanto, a incidência de varicocele é significativamente maior em pacientes com espondilite anquilosante e está associada a anormalidades na qualidade do sêmen.

Na doença de Behçet a qualidade do sêmen apresentam alterações moderadas. Semelhante à EA, a incidência de varicocele também é aumentada.

A infertilidade masculina pode ser resultado de disfunção sexual, que é explicada pela interação de fatores orgânicos e psicogênicos. As DRIMs podem levar ao comprometimento funcional, sofrimento psíquico e fadiga.

Medicamentos

Homens podem continuar o uso de hidroxicloroquina, azatioprina, colchicina, inibidores de necrose tumoral, metotrexato, ciclosporina, tacrolimus, micofenolato, leflunomida, sulfassalazina (pode alterar a contagem e qualidade dos espermatozóides), rituximabe, anti IL ( 1, 6, 17, 12/23), inibidores de JAK.

Glicocorticoide: embora altas doses interrompam o eixo hipotálamo-hipófise-gonadal e possam diminuir a testosterona, não há evidências disponíveis sobre o efeito desses medicamentos na fertilidade masculina.

Metotrexato: o efeito do metotrexato na fertilidade masculina permanece controverso. O metotrexato não parece afetar a função testicular.  Alterações reversíveis nos parâmetros do sêmen são destacadas em pacientes tratados com metotrexato, incluindo um aumento na porcentagem de células germinativas imaturas e uma diminuição na porcentagem de espermatozóides maduros. A supressão temporária da contagem de espermatozoides durante o tratamento pode ser devida ao efeito citotóxico direto do metotrexato em altas concentrações nas células germinativas testiculares. Esta é a base para muitas recomendações que exigem um período de espera de três meses após o tratamento antes de tentar engravidar, a fim de permitir que quaisquer possíveis efeitos do metotrexato no esperma se dissipem completamente.

Sulfassalazina: foi relatado que causa diminuição da motilidade espermática, oligospermia e altas taxas de espermatozóides com morfologia anormal. A descontinuação da sulfasalazina antes da concepção não é necessária. No entanto, em homens com dificuldade para conceber enquanto recebem sulfassalazina, a interrupção temporária da terapia com sulfassalazina pode ajudar a obter uma concepção bem-sucedida

Ciclofosfamida: podem induzir dano gonadal irreversível ou oligospermia prolongada. A dose cumulativa de ciclofosfamida aumenta esse risco quando são usadasdoses superiores a 7,5 g/m 2 , sendo outro fator de risco a idade em que o medicamento é administrado.

Anti TNF:  recomenda-se o uso contínuo da terapia com TNFi em pacientes que tentam engravidar suas parceiras. Um alto nível de TNF induz a atrofia testicular e aumenta o FSH e o LH devido à perda do feedback negativo mediado pela testosterona. Em contraste, o TNFi parece inibir esses efeitos.

Impacto do tratamento na teratogenecidade

Os dois mecanismos que podem explicar a teratogenicidade masculina são o efeito da droga no esperma induzido por alterações genéticas e a exposição do fluido seminal através da mucosa vaginal durante a relação sexual. Apesar desses mecanismos, o risco geral de teratogenicidade mediada por homens é baixo.

Embora os especialistas sugiram a descontinuação do metotrexato antes de tentar engravidar, as diretrizes recentes do American College of Rheumatology recomendam o uso contínuo do metotrexato, pois não foi demonstrada nenhuma evidência de mutagênese ou teratogenicidade. 

Em relação à Leflunomida, três relatos de casos na literatura documentaram a exposição paterna. Nenhum deles tem resultados adversos na gravidez. Assim, a Leflunomida é considerada compatível com exposição paterna.

Homens que desejam concepção não devem estar em uso de ciclofosfamida 3 meses antes da concepção, talidomida 1 mês antes da tentativa.

Estudos

1. Avaliando pacientes com doença inflamtória intestinal DII (base de dados francês), comparando pacientes que usaram anti-TNF até 24 semanas e as que continuaram após.

Foi avaliado a ocorrência de recaída de DII materna até 6 meses após a gravidez, resultados adversos da gravidez e infecções graves na prole durante os primeiros 5 anos de vida.

Um total de 5.293 gestações foram incluídas, entre eles, o tratamento anti-TNF foi descontinuado antes de 24 semanas para 2.890 e continuou além de 24 semanas para 2.403.

A continuação do anti-TNF foi associada à diminuição das frequências de recaída de DII materna e redução de prematuridade.

Nenhuma diferença de acordo com a continuação do anti-TNF foi encontrada em relação a natimortos, nascimentos com baixo peso para a idade gestacional e infecções graves na prole.

2. Este estudo (multicêntrico, observacional e retrospectivo) se propos a avaliar a segurança, eficácia, resultados maternos e fetais da terapia de reprodução assistida em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico.

Os pacientes estavem sem surtos moderados ou graves de LES por pelo menos um ano, ausência de disfunção orgânica importante, prednisona oral ≤ 10 mg por dia, descontinuação de imunossupressores, incluindo CYC, metotrexato e micofenolato de mofetil, por pelo menos 6 meses, para aqueles que estavam tomando leflunomida, wash-out a terapia foi administrada e a leflunomida foi suspensa por pelo menos 6 meses.

Os pacientes foram comparados com gravidez natural (planejada ou não).

Resultados adversos da gravidez: agravamento da doença, hipertensão arterial induzida pela gestação, pré-eclâmpsia, eclâmpsia, diabetes gestacional, perda fetal, parto prematuro,

Resultados adversos fetais: retardo de crescimento intrauterino, sofrimento fetal, baixo/muito baixo peso ao nascer.

A incidência de resultados adversos da gravidez não aumentou em pacientes que ralizaram reprodução assistida em comparação com a gravidez planejada e reduziu significativamente em comparação com uma gravidez não planejada.

Ainda tem dúvidas? Clique aqui!

Referências:

  • Mark D Russell, Mrinalini Dey, Julia Flint, Philippa Davie, Alexander Allen, Amy Crossley, Margreta Frishman, Mary Gayed, Kenneth Hodson, Munther Khamashta, Louise Moore, Sonia Panchal, Madeleine Piper, Clare Reid, Katherine Saxby, Karen Schreiber, Naz Senvar, Sofia Tosounidou, Maud van de Venne, Louise Warburton, David Williams, Chee-Seng Yee, Caroline Gordon, Ian Giles, BSR Standards, Audit and Guidelines Working Group, British Society for Rheumatology guideline on prescribing drugs in pregnancy and breastfeeding: immunomodulatory anti-rheumatic drugs and corticosteroids, Rheumatology, 2022
  • Sammaritano, LR, Bermas, BL, Chakravarty, EE, Chambers, C., Clowse, MEB, Lockshin, MD, Marder, W., Guyatt, G., Branch, DW, Buyon, J., Christopher-Stine, L. , Crow-Hercher, R., Cush, J., Druzin, M., Kavanaugh, A., Laskin, CA, Plante, L., Salmon, J., Simard, J., Somers, EC, Steen, V. , Tedeschi, SK, Vinet, E., White, CW, Yazdany, J., Barbhaiya, M., Bettendorf, B., Eudy, A., Jayatilleke, A., Shah, AA, Sullivan, N., Tarter, LL, Birru Talabi, M., Turgunbaev, M., Turner, A. e D’Anci, KE (2020), 2020 American College of Rheumatology Guideline for the Management of Reproductive Health in Rheumatic and Musculoskeletal Diseases. Arthritis Rheumatol, 72: 529-556.
  • Lao, M., Dai, P., Luo, G. et al.Pregnancy outcomes in patients receiving assisted reproductive therapy with systemic lupus erythematosus: a multi-center retrospective study. Arthritis Res Ther 25, 13 (2023). https://doi.org/10.1186/s13075-023-02995-y
  • Andreoli, L. et al. EULAR recommendations for women’s health and the management of family planning, assisted reproduction, pregnancy and menopause in patients with systemic lupus erythematosus and/or antiphospholipid syndrome.  Rheum. Dis.76, 476–485 (2017).
  • Sims, C., Clowse, M.E.B. A comprehensive guide for managing the reproductive health of patients with vasculitis. Nat Rev Rheumatol18, 711–723 (2022).
  • Laura Andreoli, et al. Immunology of pregnancy and reproductive health in autoimmune rheumatic diseases. Update from the 11th International Conference on Reproduction, Pregnancy and Rheumatic Diseases, Autoimmunity Reviews, Volume 22, Issue 3, 2023.
  • Antoine Meyer, Anke Neumann, Jérôme Drouin, et al. Benefits and Risks Associated With Continuation of Anti–Tumor Necrosis Factor After 24 Weeks of Pregnancy in Women With Inflammatory Bowel Disease: A Nationwide Emulation Trial. Ann Intern Med.2022;175:1374-1382.
  • Soumaya Boussaid, Yasmine Makhlouf, Sonia Rekik, Samia Jammali, Elhem Cheour, Hela Sahli, Mohamed Elleuch, Helmi Ben Saad,The effects of autoimmune rheumatic-related diseases on male reproductive health: A systematic review,Journal of Reproductive Immunology,Volume 150,2022.
Revisão médica: Dr. Diego Nunes

Reumatologista

CRM 192102 - SP

Posts recentes:

Introdução  O envolvimento cardíaco em doenças reumáticas é comum. As estruturas cardíacas afetadas incluem o pericárdio

As condições reumatológicas, que englobam uma variedade de doenças autoimunes, podem influenciar diversos aspectos da saúde,

Introdução  A supressão do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA) é um efeito inevitável da terapia crônica com glicocorticoides

Entre em contato para agendar sua consulta!